Os vídeos continuam saindo!

Silvia Rivera Cusicanqui: https://www.youtube.com/watch?v=AC_ySMO5-P0
Renzo Taddei: https://www.youtube.com/watch?v=5Dk0svv8cMI
Alf Hornborg: https://www.youtube.com/watch?v=MB1r8r8z8v0
Bronislaw Szerszynski: https://www.youtube.com/watch?v=oqr6bH_U0-o
Felipe Süssekind: https://www.youtube.com/watch?v=zfXs9McoloM
Juliana Fausto & Cecilia Cavalieri: https://www.youtube.com/watch?v=lPd_ggnifZo
Rondinelly Medeiros: https://www.youtube.com/watch?v=f8YQEzQsubY
Marcio Santilli: https://www.youtube.com/watch?v=QJKpMxuyjeM 

Vinciane Despret, Eduardo Viveiros de Castro e Ailton Krenak

Em nosso canal do youtube, agora, as falas de Ailton Krenak, Eduardo Viveiros de Castro e Vinciane Despret! Lembrando que estamos no mês da Mobilização Nacional Indígena e que o volume da coleção Encontros, da Azougue, dedicado ao grande Ailton Krenak, com prefácio de Eduardo Viveiros de Castro, acabou de ser lançado e está disponível para compra na página da editora no Facebook!

Mais sete vídeos!

Disponíveis em nosso canal do youtube, agora, os vídeos com as falas de Alexandre Nodari, Alexandre Costa, Antonio Nobre, Carlos MondragonIsabelle Stengers, José Augusto Pádua e Peter Szendy. Confiram!

Mais vídeos e nosso canal no Youtube

Continuamos subindo os vídeos! Estão disponíveis agora as falas de Lesley Green, Patrice Maniglier, Déborah Danowski e Eduardo Sterzi, além do debate da primeira mesa. Não deixem de conferir esses e outros vídeos no nosso canal do youtube: http://www.youtube.com/c/osmilnomesdegaia

Finalmente, os textos dos palestrantes \o/

Como vocês podem perceber criamos uma aba nova, ali em cima, chamada “textos dos palestrantes”, onde estamos subindo, aos poucos [conforme ordem de chegada], os pdfs de cada comunicação feita no colóquio. Como muitos quiseram mexer em seus textos [arrematar, revisar, bibliografar], não os temos todos – ainda. Mas é nessa aba que os pdfs estarão disponíveis a partir de hoje e conforme forem chegando.

Esperamos que a leitura seja proveitosa e que vocês possam usar essas referências em seus trabalhos. Para facilitar a indexação e citação, paginamos todos os textos e colocamos em um formato próprio de revista.

Espalhem os textos sem medo de copyright, pois todos estão autorizados a circular poraí!

Textos dos palestrantes

O primeiro dos vídeos: Bruno Latour

Foi dada a largada para a tão aguardada publicação dos vídeos do colóquio. Com vocês, o primeiro conferencista do evento, Bruno Latour, e sua fala What does it mean to obey “the Laws of Gaia” in trying to keep up with the old imperative: “Natura non nisi parendo vincitur”?

(Em tempo: como as legendas vão demorar um pouquinho para ficarem prontas, decidimos soltar os vídeos antes. Elas serão incluídas assim que possível :))

Povinelli, Haraway e agradecimentos

Nosso colóquio foi um sucesso! Muito obrigada a todas as pessoas que foram à Casa de Rui Barbosa, assistiram pelo streaming e participaram do debate. Ficamos felicíssimos com o resultado e esperamos que Os Mil Nomes de Gaia tenha ajudado a incentivar a discussão e a ação sobre a questão ambiental em suas diversas formas e vozes.

Vamos, assim que forem editados, disponibilizar os vídeos com as conferências aqui no blog. Por enquanto, atendendo a pedidos e para não perdermos o ritmo, eis as duas entrevistas que exibimos durante a semana passada, com as maravilhosas Elizabeth Povinelli e Donna Haraway!

 

Para assistir ao vivo clique no link abaixo.

TRANSMISSÃO ONLINE – AO VIVO – ÁUDIO ORIGINAL

TRANSMISSÃO ONLINE – AO VIVO – AUDIO TRADUZIDO

Habemus folder!

Clique aqui para ver o folder eletrônico do colóquio, com a programação atualizada

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Alexandre Nodari: A( )terra(r)

Olá, caríssimos! Depois de um não tão longo inverno, e faltando duas semanas para o início de nosso colóquio, voltamos com nossa série de entrevistas. Desta vez, Alexandre Nodari, editor da Cultura e Barbárie e membro da #ATOA, partiu da pergunta “Se Gaia tem mil nomes, como você prefere chamá-la?” para elaborar um breve ensaio que é uma espécie de manifesto eqológico.  Para baixá-lo em pdf clique aqui – e boa leitura!

terra

A( )terra(r)

O que eu quero é muito mais áspero e mais difícil: quero o terreno.”
(Clarice Lispector)

Dos mil nomes de Gaia (todos femininos, imagino, o que é sintomático de um modo positivo), o que eu prefiro é Terra, porque nos traz pra baixo, pro chão, nos aterra, pra usar uma expressão sobre a qual a Déborah Danowski sempre insiste. Essa equivocidade Terra/terra, planeta e solo, me agrada muito, porque identifica o mundo com seu substrato material, que está abaixo de nós, que nos sustenta, e nos dá sustento, que é nossa subsistência. Acho que foi partindo dessa duplicidade que montamos (a #ATOA), durante a Cúpula dos Povos, na Rio+20, o simpósio terraterra, inspirados também no famoso poema concreto de Décio Pignatari, que ressalta, aliás, tal equivocidade: a terra erra; como todo planeta, ela é errante. A Terra é Gaia, mas também é gaiata. Nesse sentido, a “Errática” que Oswald de Andrade propunha, a ciência dos “vestígios erráticos” deixados pelo Matriarcado na história de todos os povos, talvez possa ser lida como uma ciência da terra (uma terrática), semelhante à geologia da moral deleuziana, mas também e especialmente uma gaiatologia: a feliz ciência não do homem, mas do gaiato, não dessa espécie envelhecida e que envelhece o planeta, a humanidade, mas daquele ainda por vir jovem habitante de Gaia, a ciência do bricoleur, da gambiarra. Para ser mais claro, o que a catástrofe ambiental em curso nos coloca como desafio é: como nos virar com os elementos que temos (subsistir por meio de uma eco-lógica do concreto), e não mais insistir na engenharia, na lógica conceitual e transcendente que busca uma saída (no limite, da Terra, e mesmo do corpo, etc.), que visa criar uma existência qualificada, livre de todos aqueles “baixos corporais” – sejam eles materiais, sejam os da linguagem – ao fim e ao cabo, uma vida humana extra-terrestre. Georges Bataille insistia muito na diferenciação entre o alto e o baixo materialismo: enquanto aquele é, na verdade, um idealismo, ao conceber ontologicamente a matéria como coisa em si, isto é, matéria-morta (é a estratégia de Meillassoux, diga-se de passagem); este, abandonando toda ontologia, busca pensar a matéria-viva, focando justamente na “putrescência da matéria orgânica” em que os homens (e todos os demais seres) plantamos suas raízes. E aqui entra uma outra consequência da equivocidade Terra/terra: tanto a terra é um oikos quanto a Terra é um ego, um sujeito: “o mundo é um animal extremamente sensitivo”, já dizia Campanella, ou, na variante de Clarice Lispector, “o mundo é extremamente recíproco”. E encontramos essa mesma equivocidade recíproca entre ego e oikos em todos os habitantes da Terra, vivos e não vivos: não só uma pedra é, por um lado, um ser próprio, inteiro, como também é, por outro, a casa de infinitas e infinitesimais partículas, uma verdadeira sociedade, como diria Gabriel Tarde – e oikos, casa, é uma noção acima de tudo social e política. E o mesmo se passa com os seres vivos, incluindo os humanos: somos ao mesmo tempo e inseparavelmente egos e oikoi. Cada ego humano é também uma multiplicidade: “nosso” corpo é formado por (é a casa de) infinitos corpos alheios: não só células humanas, mas também, pra dar o exemplo mais evidente, um sem número de bactérias da flora intestinal. E essa estranheza (alienação, para brincar com o jargão marxista) constitutiva, a de cada eu ser também a casa de uma multiplicidade de outros, aparece de diversas maneiras no pensamento dos povos: a noção de inconsciente, por exemplo – e, para pegar o gancho psicanalítico, de certa forma, o Unheimlich é um sentimento constitutivo (ainda mais nos dias de hoje), na medida em que o mais familiar é o mais estranho e vice-versa. E talvez uma das suas expressões mais interessantes no Ocidente seja a idéia estóica da oikeiosis, geralmente vertido por “apropriação”: todo animal passa a vida inteira se apropriando de sua constituição, de suas partes, e, a partir daí, se apropriando daquilo que faz bem a elas e a si. Se, como diziam os estoicos, a natureza não estranha o animal de si mesmo, porque ela o constitui como próximo e próprio a si (ou pertencendo a si) e não idêntico a si? Se há proximidade ou apropriação/pertencimento e não identidade ou igualdade, então há diferença, diferença de si, diferença imanente a si. Mas o mais curioso talvez seja que uma outra tradução, muito mais óbvia e literal, do termo oikeiosis pras línguas modernas possivelmente explique melhor o que está em jogo (e ao mesmo tempo desloque o que entendemos por esses termos): familiarização, ou ainda melhor, domesticação. Todo habitante terrestre é uma rede de parentescos (internas e externas); ele é a construção e manutenção de casas: toda biologia é biografia. O habitat não é só uma categoria biológica, mas uma escolha (ética) vital; todo habitat é um hábito, a consistência que adquire a inter-relação da multiplicidade de seres e intensidades que habitam cada vivente. O hábito do eu é o habitat de muitos; a vida é um “estado de contato”, como dizia Clarice. Mas isso não quer dizer que a duplicidade ego/oikos implique uma harmonia, muito pelo contrário: gera ruídos, problemas, ecos equívocos entre o eu e o oikos. Todo outro (mesmo os que nos habitam) é perigoso, perigoso justamente pela sua alteridade, porque é, no limite, desconhecido: não sabemos com certeza o que esperar dele. Assim, poderíamos dizer que há basicamente duas formas de domesticação, ou duas maneiras de conceber a domesticação. A primeira delas, dominante, é a estratégia de eliminar o perigo pela segurança, eliminar o erro, o eco, o ruído, seja em nossos corpos, seja dos animais, seja do “ambiente”. Trata-se da tentativa de construir uma casa segura (para os humanos) por meio da dominação, por meio do afastamento em relação a Terra e à terra, a animalidade e a matéria baixa: são os messianismos (religiosos e políticos) que visam a construção de uma casa (vida) extra-terrena, longe de toda necessidade. Mas existe outra estratégia, ou melhor, uma miríade de contra-estratégias que preservam ao máximo essa zona equívoca de ecos, essa passagem entre o ego e o oikos (de certo modo, as duas estratégias que evoco aqui ressoam a distinção levistraussiana entre sociedades antropoeméticas e as antropofágicas), passagem que podemos chamar também de obliquação, de “vida oblíqua” (pra usar o termo de Lispector, que indica uma passagem entre o eu e o mim, entre sujeito e objeto, passagem que permite toda inter-locução e é condição da tradutibilidade). Trata-se não mais de domesticação unipolar, mas de co-domesticação, cooikeiosis, em que a reciprocidade e não a unilateralidade tem proeminência. A isso, creio, podemos chamar, com Guattari, de “eco-lógica”, a “lógica das intensidades”, mas também um discurso (equivocamente) ecoante, uma lógica das reciprocidades. Toda ecologia é também ec(h)ologia, o ressoar do eu nos outros e vice-versa; além disso, é uma equivocologia, a mesma voz (casa), mas sempre diferente; em suma, é o ecoar da equivocidade do ego, o ego ecoando equívoco o oikos que também é (e reciprocamente). Ego-logia, echo-logia, oiko-logia, equivoco-logia: eQologia, para fazer uso daquele procedimento poético de Glauber Rocha (do qual Qorpo-Santo é um precursor), que consiste em mudar a grafia de certas palavras sem alterar a sua sonoridade (“brazyleiro” com “z” e “y”, por exemplo, inserindo uma não-identificação no cerne mesmo da identidade nacional, deslocando o sentido, produzindo uma diferença na igualdade: não por acaso, foi sugerido que a “différance” derridiana fosse traduzida pela escrita glauberiana como “dyferença”, com “y” no lugar do “i”), abrindo para a multiplicidade que toda unicidade tenta acobertar (o menos Um deleuziano). Desse modo, a ecologia/eQologia não consiste em um saber sobre a Terra, mas num discurso da Terra, que é um sujeito (ego) cujos hábitos são compostos na relação recíproca (ecoante) com aqueles que a habitam (que a tem como oikos). É preciso saber ouvir os ecos da Terra/terra, até porque nós também falamos a cada discurso seu: toda inter-locução é uma equi-vocidade. E é preciso fazer ecoar esse discurso, a reciprocidade que todo eco comporta, reciprocidade que a estratégia antropocêntrica de dominação quer fazer calar a qualquer preço – inclusive a própria extinção da humanidade.

Alexandre Nodari, agosto de 2014